PCC: não há solução simples para problema complexo
O combate ao Primeiro Comando da Capital (PCC) não deixará os Estados nacionais da Tríplice Fronteira (TF) entre Argentina, Brasil e Paraguai mais próximos de eliminar o crime organizado da região.O ativista russo Artemiy Semenovskiy me questionou sobre uma possível ligação entre as lideranças da facção paulista PCC 1533 com os integrantes da facção carioca Comando Vermelho, na região da TF.
A resposta curta é: “faça o que eu mando, não faça o que eu faço”.
A resposta longa é:
Tudo começou com...
O assassinato, na região da Tríplice Fronteira, de Jorge Rafaat Toumani, em 2016 marcou o fim da parceria entre integrantes do Primeiro Comando da Capital e da facção Comando Vermelho (CV).
… que virou uma sangrenta guerra ...
Inimigos de ambos os lados são caçados, capturados, torturados e mortos, tanto no Brasil quanto no Paraguai, na Bolívia e até na Argentina — somando milhares de mortos.
… mas enquanto os moleques morrem ...
O tempo passou e a guerra esfriou: novas fronteiras foram consolidadas, com escaramuças ocorrendo apenas nas regiões ainda em disputa, no entanto, investigações policiais provaram que integrantes da cúpula do Primeiro Comando da Capital agora negociam armas e drogas com o arqui-rival Comando Vermelho.
… afinal, o buraco é mais embaixo!
Engana-se quem acredita que existe uma resposta simples para uma questão complexa:
O assassinato de Toumani deveria ter eliminado os fornecedores independentes de drogas e armas no Paraguai, sufocando o Comando Vermelho no Rio de Janeiro, mas deu chabu, porque o Primeiro Comando da Capital não levou em conta a astúcia de Adam Smith e a história da formação sócio econômica daquela região.

O PCC, a formação sócio econômica da TF e a mão invisível do mercado
Há mais de um século a região desenvolve sua vocação de polo de livre circulação de pessoas, serviços e mercadorias, paulatinamente agregando: povos, conhecimento, infraestrutura em uma emaranhada rede internacional de relacionamentos e contatos.
Uma secular, complexa, arraigada e maleável estrutura socioeconômica não se dissolveria em poucas décadas por uma ação orquestrada entre Estados constituídos, e tampouco pela morte de Toumani.
Nas duas últimas décadas, Argentina, Brasil e Paraguai desenvolveram ferramentas jurídicas, institucionais e tecnológicas com o intuito de coibir a atuação das organizações criminosas na região da Tríplice Fronteira.
O assassinato de Toumani, ao contrário do que imaginou o Primeiro Comando da Capital, não garantiu sua hegemonia na fronteira, dando lugar a outros fornecedores independentes que trataram de absorver a demanda das facções inimigas.
Os recentes conflitos entre os PCCs da região e os traficantes independentes de Fahd Jamil; e a análise das contas de Maria Alciris Cabral, esposa de Minotauro, e dos traficantes Pavão e Galã comprovam a participação dos próprios líderes PCCs nessa cadeia de fornecimento — a mão invisível do mercado não abandona ninguém.
Esses programas elaborados e implementados nas gestões Lula e Dilma visavam respaldar com equipamentos, pessoal e informação o combate ao crime organizado, mas tornaram-se uma ferramenta de marketing.
Apesar do empenho dos profissionais participantes do planejamento das operações, o resultado foi um belo espetáculo para a mídia, com fotos dos militares nas estradas e helicópteros sobrevoando as matas e os rios e policiais rodoviários e militares fazendo operações — garantindo um show para o público televisivo!
No entanto, é inegável os avanços feitos nesse período no combate ao crime organizado, criando condições para as futuras administrações.
Michel Temer continuou o processo de integração e aperfeiçoou as ferramentas jurídicas para integrar as diversas esferas de combate ao crime organizado na TF, agora com a presença também da Bolívia.
Jair Bolsonaro foi até a fronteira do Paraguai e bateu um retrato ao lado do presidente Mario Benítez.
Se Bolsonaro deixou de aprofundar os mecanismos transnacionais que visavam quebrar as grandes barreiras culturais, jurídicas e econômicas que poderiam minar as bases das organizações criminosas, pelo menos teve milhares de compartilhamentos entre seus apoiadores de sua selfie com Benítez.
E assim, respondo a Artemiy Semenovskiy, e aproveito para deixar o link o PDF do belo trabalho de Pawel, “Las iniciativas de cooperación en seguridad en la Triple Frontera Security cooperation initiatives in the Triple Border Area”, publicado no Anuario Latinoamericano Ciencias Políticas y Relaciones Internacionales v10 2020.
Uma secular, complexa, arraigada e maleável estrutura socioeconômica não se dissolveria em poucas décadas por uma ação orquestrada entre Estados constituídos, e tampouco pela morte de Toumani.
Nas duas últimas décadas, Argentina, Brasil e Paraguai desenvolveram ferramentas jurídicas, institucionais e tecnológicas com o intuito de coibir a atuação das organizações criminosas na região da Tríplice Fronteira.
O assassinato de Toumani, ao contrário do que imaginou o Primeiro Comando da Capital, não garantiu sua hegemonia na fronteira, dando lugar a outros fornecedores independentes que trataram de absorver a demanda das facções inimigas.
Os recentes conflitos entre os PCCs da região e os traficantes independentes de Fahd Jamil; e a análise das contas de Maria Alciris Cabral, esposa de Minotauro, e dos traficantes Pavão e Galã comprovam a participação dos próprios líderes PCCs nessa cadeia de fornecimento — a mão invisível do mercado não abandona ninguém.
Do desenvolvimento estratégico para o retrato tirado
A segurança da fronteira brasileira é garantida pela Estratégia Nacional de Segurança Pública nas Fronteiras (ENAFRON), pelo Sistema Integrado de Monitoramento das Fronteiras (SISFRON) e pela Operação Ágata.Esses programas elaborados e implementados nas gestões Lula e Dilma visavam respaldar com equipamentos, pessoal e informação o combate ao crime organizado, mas tornaram-se uma ferramenta de marketing.
Apesar do empenho dos profissionais participantes do planejamento das operações, o resultado foi um belo espetáculo para a mídia, com fotos dos militares nas estradas e helicópteros sobrevoando as matas e os rios e policiais rodoviários e militares fazendo operações — garantindo um show para o público televisivo!
No entanto, é inegável os avanços feitos nesse período no combate ao crime organizado, criando condições para as futuras administrações.
Michel Temer continuou o processo de integração e aperfeiçoou as ferramentas jurídicas para integrar as diversas esferas de combate ao crime organizado na TF, agora com a presença também da Bolívia.
Jair Bolsonaro foi até a fronteira do Paraguai e bateu um retrato ao lado do presidente Mario Benítez.
Se Bolsonaro deixou de aprofundar os mecanismos transnacionais que visavam quebrar as grandes barreiras culturais, jurídicas e econômicas que poderiam minar as bases das organizações criminosas, pelo menos teve milhares de compartilhamentos entre seus apoiadores de sua selfie com Benítez.
O PCC se beneficia com a política de Bolsonaro
O pesquisador polonês Paweł Trefler afirma que a causa do fracasso dos Estados nacionais no combate ao crime organizado na região é a descontinuidade nos esforços em criar mecanismos permanentes e profundos para a eficácia do combate ao crime organizado na região da Tríplice Fronteira:“... mudanças políticas radicais em países individuais, governos alternativos de esquerda e direita, juntamente com atitudes diametralmente opostas em relação à cooperação com os Estados Unidos. Como resultado, não há realmente nenhuma continuação de muitas iniciativas empreendidas em conjunto. No nível mais alto, a rivalidade geopolítica da Argentina e do Brasil, bem como a desconfiança da população local e das elites socioeconômicas em relação à administração central e aos centros de influência estrangeiros, especialmente o antiamericanismo muito forte, permanecem sem dúvida um problema sério.”
E assim, respondo a Artemiy Semenovskiy, e aproveito para deixar o link o PDF do belo trabalho de Pawel, “Las iniciativas de cooperación en seguridad en la Triple Frontera Security cooperation initiatives in the Triple Border Area”, publicado no Anuario Latinoamericano Ciencias Políticas y Relaciones Internacionales v10 2020.
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